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06/07/12

Ainda Há Justiça em Portugal!


Neste "post" fazemos uma profunda reflexão política da decisão histórica do Tribunal Constitucional que, com o seu acórdão, vem dar alento a todos os portugueses que julgavam que a Justiça portuguesa estava morta e enterrada. Não está! E isso dá-nos uma sensação de conforto e de esperança, que há muito não sentíamos, no meio da bafienta vida social e política portuguesa.
  
O Tribunal Constitucional acaba de chumbar o corte dos subsídios de férias e de natal aos funcionários públicos e pensionistas, decretado pelo governo. Finalmente, faz-se justiça! Apesar da estranha nota de suspensão temporal da inconstitucionalidade que, no meu ponto de vista, é incompreensível. Ao Tribunal só compete dizer se a medida é, ou não é, inconstitucional. Medidas excepcionais à Constituição só poderão ser tomadas em caso de declaração do Estado de Emergência ou de Sítio. Mas isso obrigava o governo a decretá-lo e, pelo que sabemos, não o fez, obviamente, por não ter qualquer razão suficientemente forte que o justificasse. Mas o que é importante aqui realçar, é que qualquer leigo de bom-senso percebia que estes cortes diferenciavam os portugueses perante a Lei. Tratava-se, obviamente, de um confisco salarial em que os privados seriam tratados como cidadãos de primeira e os funcionários públicos e pensionistas como cidadãos de segunda. Cabia a estes últimos arcar com a fatia de leão da austeridade, pela qual este governo nutre uma paixão obsessiva. Não podia, nem pode, ser!

Somente pessoas desprovidas de bom-senso, por pura estupidez e/ou preconceito, podiam ver nesta medida uma medida de corte na despesa do Estado. Roubando o que aos seus funcionários e aposentados lhes é devido, por direito, diziam que estavam a cortar na despesa! Os pensionistas descontaram toda a sua vida sobre 14 salários e os funcionários públicos regem-se por contratos laborais. Eles que ainda por cima têm carreiras e vencimentos congelados desde o governo de Durão Barroso (e da sua conversa da tanga em 2002). Só no ano passado viram os seus salários reduzidos entre 3% (1300 euros) e 10% (acima de 2000 euros). Aliás a actual decisão do Tribunal Constitucional não pode ser desligada da decisão anterior que permitiu esses cortes. Mas foi assim, como corte na despesa, que este governo, efectivamente, apresentou o confisco. A Troika aceitou-o como corte na despesa. Os "comentadores" televisivos da "nomenklatura" continuam a tentar meter-nos pelos olhos adentro este ponto de vista obtuso, chamando corte na despesa a um confisco de salários, quando na realidade não passa de um aumento de receita encapotado. Se o Estado confisca dois salários, a quem os deve por Direito, somente quem tem enorme desonestidade intelectual pode vir dizer que o Estado está a cortar na despesa. E, note-se muito bem, houve famílias aonde o confisco foi equivalente a 4 salários! Uma brutalidade sobre a qual ninguém fala. Como se pode exigir a estas famílias que elas continuem a cumprir com os seus deveres se o Estado, literalmente, as rouba? Ainda por cima, dizendo-lhes depois, que vivem acima das suas possibilidades? Somente se as pessoas lesadas não tivessem quaisquer direitos, mas só obrigações e deveres. Era o que mais faltava! E quem são os lesados? Não são somente administrativos que, por ventura, ganham mais no sector Estado do que no sector privado e que pouco ou nada produzem. Isto é uma mistificação e um preconceito que tentam generalizar injustamente. Há bons e maus profissionais em todo lado, no público e no privado. A maioria são trabalhadores empenhados, com desempenhos que colocam as instituições públicas aonde trabalham ao nível do melhor que há no mundo. Tomáramos nós que existissem entidades e organismos privados com desempenhos semelhantes. O país não estaria, certamente, na situação em que se encontra. Um exemplo é o das universidades públicas portuguesas. Por isso, muitas das pessoas que foram e são estigmatizadas com o rótulo de funcionário público, são pessoas de elevado mérito, com elevada formação académica e altamente especializadas que, na maior parte dos casos, ganham menos do que os seus colegas da privada. Falamos de médicos, de cientistas, de professores, sem falar, obviamente, de muitos outras carreiras que nem sequer têm paralelo no sector privado, como seja o caso dos juízes e magistrados, polícias, militares, diplomatas, etc, etc. Ou seja, profissionais sem os quais o Estado, e por isso o país, não funcionaria. Esta atitude de assalto a estes profissionais, por mesquinhez e preconceito, está até nos antípodas do que se passava no anterior regime, onde todas estas carreiras eram valorizadas. Na realidade, a estigmatização destes profissionais por parte dos políticos e governantes actuais, fundamentalistas do capitalismo selvagem em que vivemos e, por isso, gente politicamente analfabeta, só poderia acontecer numa qualquer Conchichina, num qualquer país de gatunos sem lei, num qualquer Estado ditatorial terceiro mundista, para aonde os defensores desta medidas, eles sim, deveriam ser obrigados a emigrar. Mas jamais num país que diz ser um Estado de Direito. Foi isto que, na prática, o Tribunal Constitucional veio agora dizer e que era óbvio para qualquer pessoa de bom-senso. Os nossos actuais governantes e os seus acólitos julgam que vivem num qualquer país das bananas aonde vale tudo, inclusivamente limpar o rabo à Constituição da República. Pelos vistos, estão muito enganados, felizmente e a bem de Portugal. Mas atenção. O que estamos a criticar como pura estupidez não é o confisco dos salários e das pensões. É, isso sim, o princípio de iniquidade que acarreta e a divisão entre os portugueses, em função da sua entidade patronal, que este governo promoveu. Que fique bem claro. Se calhar, bastava até que taxassem um pouco mais as grandes fortunas e as transferências para os paraísos fiscais, para compensar qualquer sobretaxa fiscal sobre trabalhadores públicos e privados. Porque não fizeram ou fazem isso, em vez de estarem a criar fissuras sociais gravíssimas e a destruir o país? Até quando?

Assim, querendo fazer passar esta medida estúpida como um corte na despesa, o governo e os seus acólitos estavam literalmente a passar por cima do direito elementar da igualdade de tratamento perante a Lei dos cidadãos lesados, ao mesmo tempo que poupavam outros ao pagamento de uma taxa excepcional equivalente a dois salários. Quatro salários no caso dos casais em que ambos trabalham para o Estado. E foi isto que o Tribunal veio dizer. Foi o princípio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a Lei, que esta medida estúpida põe em causa (artigo 13º da Constituição), que levou os juízes a decidirem (9 contra 3), sem qualquer margem de dúvida, portanto, ao contrário do que diz o Sr. Marques Mendes! Mas também não percebo o que pode levar um juiz, a não ser que seja muito mal formado, a não declarar inconstitucional esta medida de inconstitucionalidade tão óbvia. Adiante...

Mas pior. Será que o governo agiu conscientemente e responsavelmente nesta matéria? Sem dúvida alguma que sim, a julgar pelo seu fanatismo político de cariz neoliberal, metendo a social democracia na gaveta e fazendo com que Sá Carneiro rebole no caixão. E esta evidência é, talvez, a prova maior da incompetência do actual governo. Porque, com a sua atitude prepotente e deplorável, pois os funcionários e pensionistas nem sequer tiveram direito a uma palavra que fosse, viraram portugueses contra portugueses, quando a hora difícil que o país atravessa exigiria a união de esforços entre todos para ultrapassar a crise. Esta é que é a crua realidade dos factos, contra a pura demagogia do governo e dos seus defensores. Com a fissura social que estes governantes abriram, jamais Portugal poderá vencer a crise. Nós não temos qualquer dúvida acerca disto. O Presidente da República, por seu turno, se começou por abrir a boca contra o que se estava a desenhar, depressa a fechou. Porquê é que ninguém sabe!

A piorar tudo, ainda por cima, esta estúpida e prepotente medida não teve qualquer efeito nas contas do Estado, ou melhor, teve até o efeito contrário, pois a austeridade e o mau estar social que ela gerou, ligados à recessão, ao abaixamento de cobrança de impostos e ao aumento da despesa por via do desemprego, coloca o défice actual do Estado em situação pior, pasme-se, do que aquela que existia no ano passado durante o governo de Sócrates. Mas era preciso ser alguma sumidade para ter previsto o resultado de tanta asneira? Previam uma recessão de 2,8% no orçamento?! Nem era preciso fazer contas para perceber que isso era uma utopia completa face às políticas estúpidas que queriam impor à viva força, ou seja, atacar o funcionalismo público. Bastava alguém que soubesse pensar um pouco, para além de só saber fazer contas de somar e de sumir. E ainda continuam a dizer que o ministro das finanças é competente? Credo! Deus nos valha! Enfrentamos uma crise empolada várias vezes por pura incompetência de quem nos (des)governa e a quem as responsabilidades terão que ser assacadas no futuro. Ressabiado o primeiro-ministro já começou a fazer chantagem e, ao mesmo tempo que atira achas para a fogueira social, mostra descaradamente que afinal está a borrifar-se para o escandaloso desequilibro que se verifica entre o corte da despesa (que não tem sido nenhum) e o aumento da receita (impostos, confiscos e sobretaxas) que tão bem sabe fazer. Aliás, só sabe fazer isso e, com isso, está a levar o país para o abismo! Mas que fique muito claro, não vá esta gente aproveitar a boleia da decisão do Tribunal Constitucional para desculpar a sua incompetência pura. É que a inconstitucionalidade só começa a valer para o próximo ano. Aliás, só assim se consegue perceber a decisão dos juízes de suspender a Constituição para este ano. É que, caso contrário, o governo teria o álibi perfeito para desculpar a sua incompetência e o descalabro das suas políticas. Políticas que vão atirar o país, já este ano, para um buraco de onde dificilmente sairá. Assim o Tribunal Constitucional desarmou completamente o governo e, por esse motivo, o mal-estar nas suas hostes tornou-se indisfarçável. 

Podemos, portanto, concluir que este governo desde cedo começou a aldrabar as contas. A aldrabar tudo. Pois só aumentou a receita, e quer continuar a aumentar a receita à viva força, dizendo que agora vai "roubar" também os trabalhadores do sector privado, sem nada fazer pelo lado da despesa. Verdadeiramente infernal! O pior é que já não dá para cobrar mais impostos. Acabou. Os portugueses estão no osso. Aumentar impostos agora significa baixar ainda mais a receita. Esta é que é a verdade! Neste contexto, não me coíbo de dar uma lição ao governo por saber que teria sido incomensuravelmente mais competente do que ele. Escrevi-o aqui por diversas vezes. A solução que deveria ter sido tomada para o orçamento deste ano, não fosse a estúpida e errada interpretação do binómio despesa/receita que fizeram, preconceituosa até, teria sido aplicar a solução que aplicaram aquando dos subsídios de Natal do ano passado, ou seja, ter aplicado uma sobretaxa sobre 50% dos subsídios de férias a todos, acrescida de uma taxa suplementar sobre as grandes fortunas. Assim, toda a gente compreenderia, toda a gente iria aceitar, dada a situação de emergência nacional e, distribuindo os sacrifícios por todos, evitariam a fissura social que abriram, promovendo ao mesmo tempo a união nacional, tão necessária nestes dias difíceis que atravessamos. Neste cenário, o consumo não seria reduzido tão drasticamente e, consequentemente, a recessão seria aliviada, bem como as falências e o desemprego. Mas não quiseram assim, por puro analfabetismo político e, pior, por puro preconceito anti-Estado, anti-povo, anti-nós. Hipocritamente, claro, porque ao mesmo tempo permitem que os privados seus amigos o parasitem. É preciso dizê-lo. E agora?

Concluindo, o governo cometeu um duplo erro fatal. Primeiro, não procedeu como explicado acima porque, segundo a sua análise errada, deturpada e mesquinha, estaria a ir somente pelo lado da receita, esquecendo que ao "roubar" somente os funcionários e pensionistas estava a fazer exactamente o mesmo, com a agravante de estar a abrir uma fissura social com contornos que ainda não sabemos muito bem o alcance. Segundo, consequência do primeiro erro, o governo comprometeu o país, perante a Troika, a fazer precisamente o contrário. Ou seja, dois terços pelo lado da despesa e somente um terço pelo lado da receita. Ora, se considerarmos a medida do confisco dos salários como um imposto adicional sobre alguns portugueses, como na realidade o é à luz do direito, como fica demonstrado pelo acórdão do Tribunal Constitucional, então a redução da despesa que este governo fez no último ano reduz-se a, praticamente, ZERO! Ou seja, têm agido somente do lado da receita. E a Troika avalia isto positivamente? Como assim? Porque se a Troika levar em conta esta decisão judicial, depressa percebe que confiscar salários a alguns, à luz das mais elementares regras do Direito, não pode ser considerado corte na despesa, mas sim aumento de receita. Certo? E quais as consequências da mentira? Pois, para cortar na despesa, era preciso mexer nos interesses instalados. Nos deles e nos de quem manda neles. Cortar na despesa não é, como estes senhores consideram, roubar os salários das pessoas que dão o melhor de si. Não senhor! Para cortar na despesa era preciso acabar com os tachos dos "boys" laranjas e amigalhaços (e também nos rosas), as mordomias, os cargos de administração não executiva nas empresas públicas, as viagens sumptuosas, a corrupção desenfreada, o parasitismo dos privados ao Estado, a banca corrupta, os monopólios e os cartéis que por aí abundam, os institutos públicos de coisa nenhuma, as PPPs dos ladrões, as offshores do diabo, os interesses dos gabinetes de advogados que parasitam o Estado, a fuga ao fisco dos profissionais liberais e comerciantes sem escrúpulos, etc., etc., Tudo isto avaliado em muitos milhares de milhões de euros, que fariam dos subsídios que roubaram uma simples gota no oceano do seu despesismo. Obviamente que tudo isto são assuntos aonde provavelmente esta gente também tem interesses e onde, certamente, não dá jeito cortar.

Agora, em vez de quererem atacar todo este bolo de despesa, melhor dizendo, de todo este escandaloso roubo do Estado, e em face do "grande problema" levantado pela Justiça, que incompetentemente criaram, já andam a dizer que o equivalente da medida é o despedimento de 100.000 funcionários públicos. Mas eles não dizem que é seguro trabalhar para o Estado? Que caras de pau! Obviamente que o Estado tem despedido e subcontratado sem problemas. Que o digam os professores e os enfermeiros. Os funcionários públicos têm sido tratados como não gente por este governo. Como se o país não precisasse deles! Mas quem fará o trabalho desses funcionários? Será que o Estado pode continuar a cumprir as suas obrigações sem o contributo destes funcionários? Sem a Escola Pública (aonde os "Relvas" deste país jamais se licenciariam) ou Serviço Nacional de Saúde (para aonde muita desta gente vai a correr quando lhes dá o amoque)? E a Justiça e a Defesa? Privatizam-se também? No entanto, poderão não ser 100.000, mas há com certeza muita gente a mais. Só que falamos de profissionais diferentes. Certamente. Por exemplo nos administradores de-coisa-nenhuma-pagos-a-peso-de-ouro. Eu dou uma sugestão cuja poupança alcançaria facilmente milhares de salários "normais". Que comecem pela administração da CGD. Uma das primeiras medidas deste governo foi aumentar a administração da Caixa, dos amigos e amigalhaços, de 7 para 11, ou seja, metendo lá mais quatro dos seus boys, pagos a peso de ouro e, pior, ao serviço de privados que querem "come-la", literalmente. Dizem que reduziram os custos, apesar do aumento dos boys. Alguém acredita nisso? Se estendessem estas medidas de diminuição urgente de administradores que-nada-fazem-a-não-ser-encher-a-mula-à-nossa-custa a todas as empresas públicas, estaria o problema do défice público resolvido. Sem mais! O problema é que os nossos governantes julgam-se em estágio para o Eldorado, se é que me faço entender...

Para finalizar esta minha longa análise política realista do país actual, que não ouvimos a ninguém nos termos em que aqui a colocámos, e que aqui ficará para a posteridade, se a liberdade de expressão prevalecer nos tempos difíceis vindouros, além do governo, desta decisão histórica do Tribunal Constitucional, há que assacar responsabilidades políticas a outros incompetentes também. A começar pelo Presidente da República que promulgou o Orçamento de Estado para 2012 sem pedir a verificação preventiva da sua Constitucionalidade. Apesar de reconhecer que lhe parecia que o orçamento continha medidas inconstitucionais? Pasme-se! Afinal a sua principal função, para não falar do governo fora-da-lei que a jura, não é cumprir e fazer cumprir a Constituição da República? Mas o pior para todos nós é o facto do principal partido da oposição não assumir o seu papel e se alhear deste tremendo problema social e político. Lamentável e imperdoável. De facto, o PS tem feito uma oposição balofa, chegando ao ridículo de ter querido impedir a verificação da Constitucionalidade da medida. Falamos, obviamente, dos dirigentes do partido socialista que moveram uma autêntica guerra contra o grupo de deputados do PS que se insurgiu contra a medida e que, por isso, se uniu para reunir as assinaturas necessárias para pedir a verificação da constitucionalidade da Lei. Bem-hajam! Aos restantes, a credibilidade foi-se e, por isso, ainda que tentem instrumentalizar politicamente o Tribunal Constitucional, resta-lhes uma saída. A demissão!

Ler aqui o Acórdão do Tribunal Constitucional - via blogue Aventar

PS: dada a importância do tema em análise, fui obrigado a emendar este texto por mais que uma vez. A bem da democracia e da liberdade de expressão.

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